Posição atual do Brasil no engajamento climático

Instituições, órgãos governamentais, ONGs e organizações da sociedade civil têm desempenhado um papel fundamental na conscientização sobre a importância da eficiência energética e do uso de tecnologias sustentáveis no setor de HVAC-R.

Segundo especialistas, o Brasil está em um momento de transição para uma economia de baixo carbono, e o setor de HVAC-R desempenha um papel fundamental nessa jornada. O envolvimento ativo de instituições, ONGs, parcerias empresariais e colaborações é essencial para impulsionar a adoção de práticas mais sustentáveis e mitigar os impactos das mudanças climáticas no país. Desafios envolvem modernização tecnológica do setor de HVAC-R para torná-lo mais eficiente e sustentável, redução das emissões de gases de efeito estufa associadas à operação desses sistemas, bem como a adaptação às mudanças climáticas para lidar com temperaturas extremas.

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“O setor de HVAC-R, em especial o setor de Refrigeração e Ar-Condicionado (RAC), tem um papel-chave na mitigação das mudanças climáticas. Um estudo recente do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) aponta que medidas-chave do setor de HVAC-R pode reduzir as emissões em pelo menos 60% até 2050. Países do G20 (Fórum de Cooperação Econômica Internacional) representam 73% do potencial de redução de emissões de gases de efeito estufa por equipamentos de refrigeração e climatização. Por isso, as ações desenvolvidas no Brasil em relação às metas do Protocolo de Montreal e da Emenda de Kigali, com foco neste setor, são tão importantes. Em 2023, o Protocolo de Montreal completou 36 anos, representando um sucesso enorme da humanidade no enfrentamento de uma das maiores ameaças de todos os tempos: o esgotamento da Camada de Ozônio do planeta. Este acordo visa a proteção desse importante gás, o ozônio, que filtra os raios solares prejudiciais aos seres vivos na Terra. No Brasil, o fortalecimento do setor produtivo e os benefícios ambientais para a população estão entre os resultados atingidos pelo governo federal. O país já reduziu em cerca de 56% do consumo de HCFCs (hidroclorofluorcarbonos), uma das principais Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio (SDOs), encontradas em produtos como refrigeradores, aparelhos de ar-condicionado e espumas em geral” informa Stefanie von Heinemann, consultora e gerente de projetos da Agência de Cooperação Alemã – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ).

Stefanie von Heinemann, consultora e gerente de projetos da Agência de Cooperação Alemã (GIZ)

Ela complementa que o PBH – Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFCs é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e tem o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) como a instituição responsável pelo controle da importação, exportação, comércio, uso, destruição, recolhimento, reciclagem e regeneração das substâncias que destroem a Camada de Ozônio. Além da GIZ, as agências Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) (agência líder) e da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO) também são implementadoras de diversos projetos que compõem o PBH.

A implementação dessas ações e planos exige uma abordagem colaborativa envolvendo todos os stakeholders, incluindo fabricantes, consumidores, governos e organizações não governamentais. Além disso, a participação ativa do Brasil nas iniciativas e acordos internacionais que visam reduzir o impacto climático do setor de refrigeração e ar condicionado, contribui para os esforços de mitigação das mudanças climáticas no país e em todo o mundo.

Thiago Pietrobon, presidente do Depto Nacional de Meio Ambiente da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (ABRAVA), informa que no Brasil existem hoje duas regulações vigentes, uma voltada aos fluidos refrigerantes HCFCs e outra para os HFCs (hidrofluorcarbonetos), desenvolvido no âmbito do Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFCs (PBH) com implementação em todo o país, que resultam em reduções de emissões, além de outros programas voltados a implementação da mudança necessária.

Thiago Pietrobon, presidente do Depto Nacional de Meio Ambiente da ABRAVA

“Adicionalmente, podemos citar acordos, como na última COP 2024 (Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), firmando metas e cooperação para melhorar a eficiência energética no setor, associados à mudança de gases. Dentro dos programas brasileiros de eliminação destes gases, sempre houve um modulo de capacitação e educação. E na etapa III do PBH não será diferente, pois está previsto desde assistência técnica para as áreas como a realização de mais de 1300 cursos, atingindo 13.000 profissionais da área. Os benefícios serão sentidos diretamente pela sociedade, ao reduzir a demanda de energia necessária no funcionamento, melhorando a disponibilidade e acessibilidade, uma vez que se trata de atividade essencial, especialmente em tempo de mudanças climáticas. E indiretamente, há uma grande contribuição na redução das mudanças, pois os estudos indicam que só a Emenda de Kigali será capaz de evitar a elevação de mais 0,5°C, importantíssimo dentro de um cenário onde se busca uma elevação máxima de 1,5°C na temperatura média do plano”.

Pietrobon acrescenta ainda que as mudanças do clima, em especial os eventos de temperaturas extremas mais frequentes, tem trazido desafios aos sistemas, além de estar aumentando a demanda por eles. Além do desafio técnico de operação em ambientes extremos (talvez até fora da condição para a qual foram projetados), há ainda o impacto que causam no setor elétrico, tornando evidente a necessidade de avançarmos na eficiência energética e a maior atenção ao final do ciclo de vida destes equipamentos, garantindo o correto recolhimento dos gases e eliminação do potencial de contribuição para o problema.

Planos, ações e parcerias

Além de difundir as boas práticas nos diversos cursos ofertados, desde pós graduação, curso técnico, curso de aprendizagem industrial e cursos de curta duração, a parceria que o SENAI-SP, por meio da Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves com a Agência de Cooperação Alemã (GIZ) por meio dessa ação, no ano de 2023 formou mais de 1.500 alunos no curso de Boas Práticas em Condicionadores de Ar Compacto e Split que visa capacitar profissionais que atuam no setor do HVAC-R com técnicas que objetivam a redução de emissão de vazamentos de fluidos refrigerantes.

João Manoel Carvalho, orientador de prática profissional da Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves

“O SENAI-SP tem a missão de contribuir para o aumento da competitividade da indústria por meio de ações de educação profissional, tecnologia, inovação e empreendedorismo industrial. A Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves, alinhada a missão do SENAI-SP e as diretrizes do PBH, realiza diversos tipos de cursos e dissemina amplamente a aplicação das boas práticas e de procedimentos técnicos de instalação e manutenção nos equipamentos de refrigeração e climatização. Observamos a grande preocupação do setor de HVAC-R por optar na seleção de equipamentos e de tecnologias aplicadas, buscando obter a melhor performance energética, contribuindo para o processo de descarbonização, além de utilizar boas práticas, evitando vazamentos de fluidos frigoríficos nos sistemas de refrigeração para a atmosfera. A unidade encara as ações climáticas bem como o atendimento as legislações e normas como questões essenciais em nossos cursos. Os temas estão alinhados com os conhecimentos e capacidades técnicas que são mobilizadas pelos alunos, em nossos programas. O hábito, atitude e o valor são incorporados pelo aluno. As agendas mais conhecidas na qual o setor de HVAC-R está inserido são os protocolos de Montreal e de Kyoto, o acordo de Paris, a emenda de Kigali e, em nível nacional, o Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFC (PBH). Esses temas são tratados pela Escola em parceria com a ABRAVA, SINDRATAR-SP e empresas parceiras, além de diversos eventos, como a FEBRAVA 2023, Encontro de Inverno para Jovens Profissionais do AVAC-R e Semana Tecnológica. Observamos ainda que, nos últimos anos, o setor atende as boas práticas relacionadas ao conforto térmico, a melhoria de performance energética, ao meio ambiente, a pegada de carbono, a descarbonização, e está consciente que os sistemas de HVAC-R focam principalmente a saúde das pessoas”, diz João Manoel Delcidio Carvalho, Orientador de Prática Profissional da Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves, especializada em Refrigeração e climatização.

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), no âmbito do Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFCs (PBH), em parceria com a GIZ e a Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves formaram a primeira turma feminina no Brasil do curso de Boas Práticas em Condicionadores de Ar Compacto e Split, que tem como ênfase a melhor contenção dos vazamentos de fluidos refrigerantes. A 1ª turma exclusivamente feminina deste curso, contou com 12 alunas e teve como docente, Bianca Menezes de Carvalho Alves, engenheira mecânica que concluiu os cursos de aprendizagem industrial, técnico e pós-graduação da área de refrigeração e climatização, na Escola SENAI Oscar Rodrigues Alves. A iniciativa desta 1ª turma de mulheres contou com o apoio do Comitê de Mulheres da ABRAVA, que tem como objetivo abrir ainda mais espaço para as mulheres que desejam atuar no setor.

Por meio do PBH, ao longo das Etapas I e II, com a implementação da GIZ, ocorreram diversos resultados positivos, como por exemplo, mais de 15 mil técnicos/as foram capacitados/as em cursos de boas práticas gratuitos sobre instalação, manutenção e reparo de sistemas de refrigeração comercial e ar condicionado de pequeno porte. Somente em 2023, foram mais de 2 mil técnicos/as capacitados/as. O objetivo destes treinamentos é evitar/eliminar vazamentos de fluidos refrigerantes e aperfeiçoar a atuação dos profissionais que prestam serviços em estabelecimentos comerciais. O projeto para o Setor de Serviços, implementado pela GIZ, sob coordenação do MMA, ainda prevê a capacitação de 1 mil profissionais para o uso seguro e eficiente dos fluidos naturais alternativos, tais como CO2 e HC-290, que não prejudicam a Camada de Ozônio e apresentam insignificante potencial de aquecimento global.

Essas capacitações estão previstas para serem iniciadas no segundo semestre de 2024. Elas contarão com a criação de toda infraestrutura necessária, incluindo a aquisição de equipamentos, ferramentas e material didático, desenvolvido exclusivamente para os cursos. Para tanto, estão sendo implantados no Brasil dois centros educacionais (no modelo de mini supermercados) para a capacitação de 300 pessoas para o setor de refrigeração comercial (SENAI – Rio de Janeiro, RJ e ETP – Curitiba, PR) e cinco centros para a capacitação de 700 pessoas para o setor de ar condicionado (Escola Sesi Senai Toledo, em Toledo (PR); Escola Senai Oscar Rodrigues Alves, em São Paulo (SP); Escola Sesi Senai Jardim Colorado, em Goiânia (GO); Senai Centro de Excelência em Educação e Tecnologia Sebastião Camargo, em Porto Velho (RO), e o Centro de Tecnologias do Gás & Energias Renováveis (CTGAS-ER), em Natal (RN).

“No caso do nosso projeto, no âmbito do PBH, um ponto forte envolve parcerias criadas com escolas técnicas em todo o Brasil, em 17 estados, para ministrarem os cursos desenvolvidos pelo programa, entre elas o Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rondônia, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, São Paulo, Tocantins além do Distrito Federal. Os trabalhos ainda envolvem a criação e divulgação de materiais de comunicação/conscientização como vídeos informativos e publicações técnicas. Além de todo o trabalho já citado, no âmbito do Protocolo de Montreal, um dos grandes desafios para o Brasil está no cumprimento das metas da Emenda de Kigali. Ainda há muito para fazer, o planeta está esquentando, o que aumenta a necessidade de climatização em residências, escolas e locais de trabalho. Ao mesmo tempo, a expansão do acesso dos países à cadeia de frio sustentável – para manter os alimentos frescos e as vacinas viáveis – é essencial para satisfazer as aspirações de desenvolvimento sustentável. Ao reduzir gradualmente o consumo de hidrofluorcarbonos (HFCs), poderosos gases que contribuem para o aquecimento climático e que substituíram as SDOs na indústria de refrigeração e ar condicionado, a Emenda de Kigali poderá resultar na prevenção de um aquecimento de até 0,5°C até 2100. Em 2023, o Brasil internalizou a Emenda de Kigali à legislação nacional por meio do Decreto 11.666, 24 de agosto de 2023, e realizou Consulta Pública sobre a proposta de Instrução Normativa que regulamenta as exigências e os procedimentos relacionados ao controle de importação de HFCs e misturas contendo HFC. A norma também irá estabelecer os limites anuais máximos de importação, em atendimento à Emenda de Kigali. No momento, o governo brasileiro, com apoio das agências implementadoras, como a GIZ, está elaborando a Estratégia Geral para a implementação da Etapa I Emenda de Kigali no país. Esta estratégia será trabalhada ao longo dos anos de 2024 e 2025 e a implementação deve ocorrer de 2026 e a 2029”, destaca Stefanie.

Estratégias e impactos positivos

Em termos de agenda futura, a GIZ está trabalhando, sob a coordenação do MMA, na Etapa III do PBH (consulta pública realizada no final de 2023), na qual o Brasil irá buscar financiamento junto ao Fundo Multilateral para a Implementação do Protocolo de Montreal para eliminar o consumo de cerca de 6,4 mil toneladas métricas de HCFCs. Entretanto, para alcançar a meta de eliminar o consumo dos HCFCs em relação à linha de base do país até 2030, o país irá eliminar o consumo de cerca de 2,9 mil toneladas métricas de HCFCs como contrapartida aos recursos a serem recebidos.

Stefanie pontua a estratégia da Etapa III, no geral (com implementação pela GIZ e outras agências implementadoras internacionais), que envolve:

– Conservação do banco de HCFCs no país, seja regenerando, reciclando ou evitando o vazamento dos fluidos refrigerantes, no sentido de manter estoque e evitar a substituição antecipada por substâncias de alto Potencial de Aquecimento Global (sigla GWP, em inglês Global Warming Potential);

– Promoção do uso seguro e eficiente de fluidos refrigerantes alternativos de zero PDO (Potencial de Destruição da Camada de Ozônio) e baixo GWP e que proporcionem maior eficiência energética;

– Implantação de treinamentos de diferentes níveis de profissionais que atuam no setor de serviços, nos subsetores de Refrigeração e Ar Condicionado;

– Prestação de assistência técnica para a execução de projetos demonstrativos, que possuem potencial de serem reproduzidos nos subsetores abordados, evitando assim as conversões transitórias.

No caso da GIZ, destaca-se que, além da continuidade dos treinamentos de profissionais em todo o Brasil, também está previsto um projeto de Certificação de Profissionais do setor RAC, com engajamento das entidades do setor e as escolas parceiras.

“O nosso trabalho, pela GIZ, no âmbito do PBH, traz resultados muito consistentes como já citado anteriormente (questão 2), com centenas de cursos e milhares de técnicos/as de refrigeração capacitados. São profissionais que mudam suas vidas e evoluem em suas carreiras após realizarem os treinamentos de Boas Práticas em Refrigeração e Ar Condicionado do PBH. Mas, posso enfatizar que o principal resultado, que faz a diferença para o meio ambiente, é a consistente eliminação de vazamentos de HCFCs e redução no consumo deste fluido no país. Aproveito para destacar que, recentemente houve um encontro em Brasília que teve como objetivo principal dar início à fase preparatória que estabelece as bases para a elaboração da estratégia abrangente que guiará a redução do consumo dos Hidrofluorcarbonos (HFCs) no Brasil, como define a Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal, ratificada pelo Brasil em outubro de 2022”, esclarece Stefanie.

Já o presidente do DN de Meio Ambiente da ABRAVA, acrescenta que por muito tempo, as ações e soluções estiveram pautadas apenas na escolha de um fluido refrigerante de menor GWP, e isso continua na pauta, mas não pode ser mais a única medida. “A redução de vazamentos se tornou, mundialmente, um forte ponto de atenção, pois o gás só traz problemas se vazar e estamos trabalhando nisso com resultados positivos. E uma visão mais sistêmica, que considera o gás, o projeto, a operação/manutenção e a eficiência energética, tem sido o caminho com o melhor custo-benefício tanto econômico, quanto ambiental, além do acesso a informação, facilitando a tomada de decisão do consumidor, assim como cria um ambiente de competição saudável pela busca de equipamentos com melhores atributos e a eficiência energética é um deles. Os programas de certificação seguem aumentando e se adequando aos novos parâmetros, em um processo de melhoria contínua”, conclui Pietrobon.