Energia geotérmica, um futuro mais verde à vista

Fonte limpa tem sido cada vez mais estudada com vistas a inseri-la futuramente na matriz energética brasileira.

País com enorme potencial geotérmico, o Brasil já percorre a estrada em direção a um futuro de exploração da geotermia, que pode desempenhar importante papel na diversificação da matriz energética nacional, ajudando a reduzir a dependência de fontes não renováveis, como petróleo, carvão e gás natural.

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Segundo especialistas, a geotermia apresenta vantagens significativas em relação a outras fontes renováveis de energia, como a solar e a eólica. Enquanto a produção de energia dessas duas fontes depende das condições climáticas, o mesmo não ocorre com a geotermia, que fica disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, independentemente do clima.

Existem três tipos principais de usinas geotérmicas convencionais – vapor seco, acima de 235 °C; flash, em que há uma mistura de água e vapor, com temperatura entre 150 °C e 170 °C; e ciclo binário, em que a água, entre 120 °C e 180 °C, entra em contato com um segundo fluido – com ponto de ebulição mais baixo – e é vaporizada. Em todo mundo, a calefação de ambientes e os banhos termais correspondem a 66% da utilização de energia geotérmica.

Os Estados Unidos são, atualmente, o maior produtor de energia elétrica geotérmica do mundo. O campo geotérmico The Geyser, na Califórnia, por exemplo, é composto por 22 usinas e tem uma capacidade instalada de mais de 1,5 gigawatts de potência.

Com aproximadamente 600 fontes termais e 200 vulcões, a pequena Islândia detém a maior produção per capita de energia elétrica geotérmica do planeta. Cerca de 25% de toda a energia elétrica da ilha europeia tem origem geotérmica. Indonésia, Filipinas, Turquia e Nova Zelândia também se destacam na produção de energia geotérmica. De acordo com a Agência Internacional de Energia, a capacidade global de energia geotérmica deve crescer cerca de 50% até 2025.

Entretanto, é importante considerar questões ambientais e de segurança. A exploração da geotermia pode envolver a perfuração profunda no solo, podendo gerar impactos ambientais significativos, como a liberação de gases de efeito estufa. Portanto, é fundamental que sejam tomadas medidas adequadas para mitigar esses impactos e garantir a segurança das pessoas envolvidas na exploração geotérmica.

 Potencial brasileiro

Muitos desafios precisam ser enfrentados para que a geotermia seja uma fonte de energia viável no Brasil. Um dos principais obstáculos é o alto custo inicial de investimento, que pode ser um fator limitante para a implementação de projetos geotérmicos em grande escala. Mas há outros processos que também vão dificultar a expansão deste mercado.

“O Brasil tem um subsolo em que água e vapor são encontrados em temperaturas baixas ou moderadas. Isto inviabiliza a construção de usinas geotérmicas convencionais. Mas, quem sabe, poderemos vir a ter uma usina geotérmica não convencional do tipo EGS (Enhanced Geothermal System)”, explica o físico Roberto N. Onody, professor sênior do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP.

Em artigo sobre o tema, o especialista enfatiza que “basicamente, em uma usina EGS, um fluido frio é injetado em um poço (previamente perfurado), profundo o suficiente para atingir rochas muito quentes, secas e impermeáveis, e fazê-lo jorrar, na forma de vapor muito quente, por um outro poço de saída, próximo e paralelo”.

“Portanto, diferentemente das usinas tradicionais que buscam bolsões de fluidos aquecidos, nas usinas geotérmicas EGS os alvos são rochas quentes, impermeáveis e secas. São perfurados poços (com profundidades de alguns quilômetros) nos quais o fluido frio é injetado. Este fluido, ao entrar em contato com rochas muito quentes, se aquece (alta pressão) e, através de um segundo poço, aflora à superfície (pressão atmosférica), onde o fluido se evapora passando a movimentar as turbinas”, detalha.

Para se ter uma ideia do tamanho da dificuldade de expansão, segundo o Conselho Mundial de Energia, a geotermia responde, em todo mundo, por apenas 0,4% da energia gerada. No entanto, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), em 2020, a geotermia representou somente 0,02% da capacidade instalada de geração de energia elétrica no Brasil.

Apesar deste cenário ora nublado, a perspectiva para o futuro de geração de energia geotérmica no Brasil é bastante positiva. O País pode se tornar um dos principais produtores do mundo, aproveitando suas reservas de calor na crosta terrestre. De acordo com estudo do Ministério de Minas e Energia em parceria com o Serviço Geológico do Brasil, temos um potencial geotérmico de cerca de 37 GW, representando uma capacidade energética equivalente a mais de 30 usinas nucleares.

Hoje, esta fonte de energia geotérmica na matriz energética brasileira é bastante limitada, sendo utilizada apenas em áreas de lazer, como ocorre em Poços de Caldas (MG) e Caldas Novas (GO), cidades que utilizam suas fontes termais de água para o turismo.

Mas esta realidade começou a mudar ainda em 2021, com o início das obras do CICS Living Lab, na Escola Politécnica da USP, em São Paulo. A construção será capaz de gerar sua própria energia para climatizar os ambientes usando tecnologia baseada em energia geotérmica, a qual permite a transferência de calor do solo para o edifício por meio das fundações.

O processo é bastante simples. O calor é captado ou rejeitado do solo através de estacas que fazem parte das fundações do edifício. A grande área de contato delas com o solo permite a troca térmica, por meio de tubos instalados em seu interior, os quais transportam o fluido que leva o calor para a superfície, onde uma bomba geotérmica faz a troca de calor entre o subsolo e o interior do prédio.

“O solo funciona como uma espécie de bateria ou reservatório de energia térmica”, descreve a pesquisadora Thaise Morais, do Departamento de Geotecnia da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), explicando que essa troca é feita de forma contínua e repetitiva até que a temperatura desejada para o ambiente seja alcançada.

De acordo com a especialista, que lidera o projeto, a expectativa é de que a implementação desse sistema possa reduzir significativamente as despesas com o consumo de energia elétrica por aparelhos de ar condicionado. Com a construção desse prédio, espera-se que outras edificações sigam o exemplo e adotem tecnologias similares para promover uma construção mais sustentável e eficiente.

Diante desse cenário positivo, especialistas concordam ser fundamental a implementação de políticas públicas que incentivem a pesquisa, o desenvolvimento e a exploração da geotermia no País. Entre as medidas necessárias estão a criação de marcos regulatórios específicos para o setor geotérmico, o fomento à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias mais eficientes e sustentáveis, além da concessão de incentivos fiscais e financeiros para projetos de energia geotérmica.

Com isso, será possível aproveitar todo o potencial da geotermia como fonte de energia limpa e renovável no Brasil, contribuindo para a redução das emissões de gases de efeito estufa e para a construção de uma matriz energética mais diversificada e sustentável.