Inteligência ao alcance das mãos
Embora monitorar a distância sistemas de refrigeração e ar condicionado não seja nenhuma novidade, chama a atenção a velocidade com que vêm surgindo e se popularizando na área o uso de aplicativos que, literalmente, estão assumindo o controle.
Antes restrita a micros, notes e netbooks, a comunicação on line entre equipamentos, usuários, operadores e mantenedores avança em ritmo exponencial, deixando atônitos até mesmo especialistas diante de cenas no mínimo improváveis pouco tempo atrás.
“Imagine uma sala de aula repleta de alunos alterando o setup do condicionador ao seu bel prazer, usando para isso apenas os celulares, como se manejassem controles remotos individuais”, exemplifica o pesquisador do Laboratório de Engenharia Térmica e Ambiental e professor da Escola Politécnica da USP, Antônio Luis Campos Mariani.
Por mais que possa parecer fictício, o episódio narrado por ele realmente aconteceu, e bem diante dos seus olhos, o que acabou ajudando a despertar no estudioso interesse especial por cuidados redobrados com a segurança nessa área, em moldes semelhantes ao verificado atualmente na proteção de redes e websites contra invasões de várias naturezas.
“Por mais positiva que seja, a atual universalização de acesso certamente vai exigir novos protocolos de controle, assim como bloqueios e restrição nos sistemas de comunicação das máquinas”, ressalva Mariani.
Em outras palavras, login e senha tendem mesmo a entrar na rotina das instalações comerciais e domésticas que pretendam evitar surpresas desagradáveis com temperaturas e velocidades de ventilação misteriosamente destoantes das escolhidas originariamente pelos seus usuários.
Tal suposição encontra eco em notícias recentes envolvendo nomes como a Samsung, líder mundial na fabricação de smartphones, que têm demonstrado nítida preocupação em ampliar seu know-how na integração entre esses aparelhinhos maravilhosos da vida moderna e o ar-condicionado. Em agosto último, por exemplo, a empresa comprou a coreana SmartThings, desenvolvedora de plataformas sediada nos EUA e cuja especialidade são justamente os aplicativos para a climatização das chamadas “casas inteligentes”.
GANHOS PRÁTICOS
De uma forma geral, contudo, o professor Mariani, que também leciona no Programa Smacna de Formação Continuada, considera altamente positiva toda essa efervescência em torno da mobilidade no HVAC-R.
Posição, aliás, compartilhada por Daniel Demétrius Bernardini, diretor do Centro Técnico de Refrigeração (CTR), instituição igualmente localizada na capital paulista, especializada na realização de cursos livres de curta duração .
“Hoje você tem nos smartphones diversos aplicativos para obter informações importantes, até fazer cálculo de super aquecimento e subresfriamento. Basta colocar os valores de pressão para ter a temperatura e vice versa, o que substitui com vantagem as planilhas”, observa o desenhista industrial especializado em marketing.
Segundo ele, dados importantes como esses aparecem em segundos no visor do aparelho, possibilitando expressivos ganhos em tempo e precisão, comparativamente ao ocorrido quando os refrigeristas cumpriam essa rotina diária muitas vezes na base do lápis, papel e borracha .
“Mesmo com um aparelho nem tão sofisticado, atualmente é possível chegar-se rapidamente a resultados que permitem adotar as melhores soluções no momento da manutenção”, exemplifica Bernardini.
Dentre os sistemas do gênero disponíveis no mercado está o DuPont PT Calc, dotado de versão eletrônica da tabela de Pressão x Temperatura, que pode ser utilizado tanto em aparelhos da Apple quanto em qualquer outro compatível com o sistema Android. A ferramenta contempla ainda informações sobre composição, propriedades químicas, físicas e ambientais envolvendo as linhas DuPont Suva® e DuPont ISCEON®, além de especificações sobre óleos lubrificantes recomendados.
Já o Refri Slider Danfoss, também desenvolvido para Android e iPhone, oferece as informações mediante digitação ou deslocamento do indicador gráfico na régua de refrigerantes, onde se encontra a lista atualizada dos diferentes fluidos disponíveis no mercado para as mais diversas aplicações.
PARCERIAS VIRTUAIS
Tantos recursos inteligentes ao alcance das mãos estariam incentivando o individualismo, com as pessoas muitas vezes aparentando estar hipnotizadas frente às telinhas mágicas dos seus celulares, certo? Errado, dizem sem pestanejar profissionais de informática como Marcelo Ferreira, da Estalo Desenvolvimento e Tecnologia, empresa de Joinville (SC) especializada em softwares para processos psicométricos, cálculo de carga térmica, manutenção, orçamento e rotinas de CRM e gestão.
Nos últimos 15 anos, esse engenheiro mecânico de formação tem dedicado parcela significativa do seu tempo, juntamente com a equipe, a procurar formas de a ciência da computação colocar-se a serviço do HVAC-R, a princípio nos saudosos palmtops, mas hoje também em larga escala na WEB, tablets, e claro, na mania nacional chamada smartphone.
Hoje, sua solução de gestão integra totalmente os sistemas de escritório, para acesso via microcomputador, com os módulos voltados a smartphone e tablets. Boa parte do conhecimento acumulado no dia a dia com a utilização da ferramenta tem sido compartilhada pelos clientes e parceiros da empresa, graças a um recurso inovador agregado pela Estalo.
“Informações técnicas frequentemente são escassas ou seus valores, sejam na forma de contratação de um consultor ou um novo funcionário, às vezes são proibitivos. O conceito que incluímos no sistema chama-se e-colaboração, permitindo criar informações básicas em forma de catálogo e, caso o usuário deseje, pode compartilhá-las com outras empresas” , explica Ferreira.
Os resultados práticos dessa verdadeira confraria digital envolvendo a cadeia produtiva da climatização inclui a redução de custos operacionais e a difusão de conhecimento. “Esta integração de informações técnicas entre prestadores de serviço de todos os portes, clientes finais, consultores e empresas têm como finalidade o melhoramento técnico do mercado e a divulgação comercial, o que traz ganhos reais para todos”, acrescenta o empresário.
SALA DE AULA
Mas, por trás de tantas novas possibilidades trazidas pela união entre informática e comunicação de dados, existe um grande desafio a ser vencido pelas instituições que ensinam o HVAC-R Brasil afora.
Afinal, vivemos em meio a contrastes , haja vista a utilização em larga escala, por exemplo, de sistemas como o Estalo Thermal Design na Escola de Educação Profissional SENAI Visconde de Mauá, no Rio Grande do Sul, enquanto um contingente ainda expressivo de profissionais do setor mal conhece o computador e seus programas mais básicos.
Consciente dessa realidade, a paulistana Escola Argos – onde 25 % das vagas são preenchidas por profissionais já contratados ou aspirantes ao HVAC-R – mantém uma programação bastante variada e um laboratório à disposição dos alunos de todos os cursos para que conciliem os conhecimentos teóricos específicos que adquirem em sala de aula à utilização prática de sistemas informatizados.
“A refrigeração é um dos segmentos que mais carecem de mão de obra, as empresas ficam desesperadas à procura de nossos alunos, e a informática é elementar na formação desses profissionais, desde a simples elaboração de um orçamento no editor de texto ou a pesquisa de algum produto ou material na internet , até a realização de projetos com AutoCAD”, pondera o diretor da Unidade Lapa, Mário Sérgio Paro Vieira. Professor da escola há mais de 10 anos, o arquiteto Eric Zompero enfatiza justamente a importância desta última ferramenta. “Se o projeto de ar-condicionado não vem em AutoCAD, nem há como compatibilizá-lo com o projeto de arquitetura, tampouco registrá-lo ou fazer as possíveis alterações necessárias. Tanto é que shopping centers, por exemplo, exigem neste formato todos os desenhos técnicos envolvendo a área de climatização”, acrescenta.
Na Faculdade Profissional (FAPRO), de Curitiba, a instituição pertencente ao Grupo Técnico Profissional (ETP) também leva o ensino da informática muito a sério, mantendo em sua grade desde cursos sobre softwares consagrados de uso geral como o Office, até sistemas altamente específicos relacionados a dutos, sistemas VRF e válvulas de expansão, dentre outros.
Na condição de bola da vez na área, seja qual for o segmento de atuação profissional, o professor e mestre em Desenvolvimento de Tecnologia do Instituto de Engenharia do Paraná, Alexandre Fernandes Santos, não tem a mínima dúvida ao apontar o Autodesk BIM (Building Information Modeling). “Ele promove um método avançado de trabalho colaborativo usando um modelo criado a partir de informações coordenadas e consistentes”, resume o especialista sobre o software que mostra todos os sistemas de uma obra sobrepostos em 3 D .
Tal processo, segundo ele, viabiliza a tomada de decisões nos primórdios de qualquer projeto, bem como o desenvolvimento de documentação de melhor qualidade e a avaliação de alternativas sustentáveis ou melhorias, permitindo a análise pormenorizada de todos os detalhes no melhor momento possível, isto é, antes que tenha início a fase de execução da obra, um antigo gargalo do HVAC-R e outras áreas onde planejar bem seja fundamental.