Autoestima em alta no setor
O mito de que as empresas sempre reclamam, até mesmo quando as coisas não caminham tão mal, tem bons motivos para ser repensado no HVAC-R brasileiro, pelo menos na atual virada de calendário que estamos vivendo.
Tão notável quanto esta percepção, obtida no tradicional levantamento de fim de ano realizado pela Revista do Frio, é o motivo revelado pela maioria dos entrevistados ao se dizer satisfeita com os resultados colhidos de janeiro até aqui. Em outras palavras, a lição de casa foi feita e recebeu uma boa nota, dão a entender as declarações que colhemos.
“Esse ano para nós, assim como 2012, foi de crescimento. Isso aconteceu em função do contínuo lançamento de novos produtos e da reorganização comercial da empresa, com foco em segmentos específicos de mercado, e não em razão da economia que andou de lado, tendo um PIB muito modesto”, afirma o diretor comercial e de marketing da Heatcraft, Paulo Andrade.
Na mesma linha testemunha Robert van Hoorn, da MultiVac, para quem 2013 também vai terminando como um período de grande crescimento, algo que ele igualmente atribui a um fator interno: “a crescente aceitação das inovações trazidas pela nossa empresa ao mercado”, afirma o diretor da indústria, mesmo reconhecendo a influência do forte ritmo da construção no País para tal desempenho.
“Os bons resultados que obtivemos se devem ao trabalho conduzido, já há bastante tempo, para mostrar os diferenciais de nossos produtos e a confiabilidade da marca Armaflex”, assegura o diretor de negócios para a América do Sul da fabricante de isolantes térmicos, Marcio Nieble, que segue raciocínio semelhante.
Na Qualitas, a responsável pelo Marketing, Fernanda Stivalli, não foge muito disto ao atribuir ao corpo de engenharia de sua empresa um período que define como favorável, não só em faturamento, como também em fortalecimento da marca e expansão para outros nichos. Uma equipe, segundo ela, qualificada e especializada para desenvolver produtos compatíveis à performance exigida por diferentes aplicações.
“Mantemos na empresa a política de trabalhar cada vez mais, com ações inovadoras, independentemente da conjuntura, sempre aumentando o investimento em desenvolvimento de novos produtos e marketing”, engrossa o couro da autoconfiança Antonio Gobbi, diretor da Full Gauge, ao falar em 22% de crescimento, comparativamente ao ano passado.
A Termomecanica, por sua vez, atribui sua boa fase ao aquecimento do setor de ar condicionado combinado a “uma maior aproximação da empresa aos seus clientes”, conforme assinala o gerente de vendas e exportação da empresa, Marcelo Silva, ao justificar os 15% de expansão nos negócios registrados este ano.
AJUDAS DE FORA
Embora muitas vezes tenham estado dentro de casa os motivos preponderantes para um 2013 memorável, nossa pesquisa de opinião também mostrou a existência de um número considerável de aspectos externos contribuindo para o sucesso.
Foi o caso da DuPont, onde o diretor de Fluorquímicos para a América Latina, Maurício Xavier, reconhece na redução gradual das cotas de importação de HCFCs, segundo o cronograma estabelecido pelo governo federal, um impulso considerável para bons resultados das vendas no Brasil de suas linhas alternativas Isceon e Suva.
Um período de crescimento econômico mais consistente, com reflexos inclusive no campo das exportações, foi o ponto alto identificado pelo diretor da Mipal, Cláudio Palma, que também credita à na redução do endividamento das famílias um fator positivo a ser levado em conta.
A Forming Tubing, por sua vez, comemora os incentivos oficiais concedidos à Zona Franca de Manaus e o aumento do IPI para os equipamentos importados, garantido com isso uma presença maior no mercado de seus clientes aqui estabelecidos. “O exercício apresentou alta de aproximadamente 15% nos nossos negócios, expansão que se deve, principalmente, ao aumento de nossa participação nos principais fabricantes de ar condicionado”, informa o diretor comercial da empresa, Wilson Cará.
Na visão da Vulkan do Brasil, o fator extra-empresa que mais pesou positivamente em 2013 foi o programa governamental Minha Casa Melhor, que ao manter elevada a demanda por refrigeradores, beneficiou diretamente seu sistema Lokring para a união de tubos sem solda, largamente aplicado neste tipo de aparelho. “Mas o ano foi similar ao anterior, devido a incertezas no cenário econômico brasileiro, que têm levando alguns clientes nossos a serem mais conservadores nas compras e investimentos”, ressalva o diretor comercial da empresa, André Corrêa.
A preocupação crescente com o meio ambiente também esteve na lista de aspectos conjunturais positivos, conforme explica em sua análise a diretora geral da Ebm-Papst, Adriana Belmiro. Embora mercados igualmente interessantes para a empresa, como o de Telecom, ainda não tenham deslanchado em função dos eventos esportivos dos próximos anos, refrigeração, ventilação e ar condicionado têm garantido uma contrapartida interessante, pois valorizam bastante os atributos que ela aponta nos produtos da empresa com relação à sustentabilidade.
A Apema também atribui ao mercado o aspecto principal para um ano em que suas vendas tiveram um crescimento da ordem de 10%, superando significativamente a alta prevista para o PIB e os próprios 8% projetados para a expansão do HVAC em 2013, contabiliza o gerente comercial da empresa, Hugo Matos. Com mais de 90% de sua atividade voltada ao mercado interno, a Soler & Palau afirma ter crescido 45% de janeiro a setembro, em relação a igual período do ano passado, algo que a gerente de marketing, Denise Ehlers, vincula diretamente à conjuntura nacional. Mais especificamente, ao PAC, somado à proximidade da Copa do Mundo e ao desenvolvimento do setor energético, notadamente envolvendo gás e petróleo.
FICOU PARA 2014
Independentemente dos pontos favoráveis, sejam de ordem corporativa ou conjuntural, o balanço das empresas sobre mais um período de atividades que se encerra deixa claro haver várias mudanças pendentes para o novo ano que se aproxima.
No caso da Heatcraft, por exemplo, a instabilidade do dólar não vai deixar saudade, já que boa parte da composição dos seus custos se baseia na moeda norte-americana. Igualmente preocupante para a empresa em 2013 foi a persistência da burocracia do governo para instrumentos como Finame e cartão BNDES, “sem contar o crescimento modesto do País no que diz respeito ao PIB e à produção industrial”, pontua Paulo Andrade. Para contornar tais entraves, as soluções encontradas incluíram fazer headge de metais e moeda, implementar projetos para reduzir custos e manter cerca de uma terça parte de seu faturamento a cargo de novos produtos, “para oxigenar sempre nosso portfólio”, reforça o executivo.
O euro, por sua vez, motivou inquietação de outra empresa de origem estrangeira, a Ebm-Papst, que importa da Alemanha os produtos vendidos aqui. O impacto disto em seus resultados vem sendo contornado com medidas como a contratação do gerente de vendas Daniel Marcucci. Além de trabalhar a carteira já conquistada, ele assumiu com a missão de buscar novos mercados no País. “Também investimos bastante em treinamentos, palestras e eventos pelo Brasil”, intervém Adriana Belmiro, prometendo a continuidade dessas estratégias em 2014.
Para a Mipal, o pacote de adversidades do ano que vai terminando engloba inconsistência nas regras de liberação de crédito, crescimento da falta de confiança na economia brasileira, aumento no preço das commodities, perda de produtividade das empresas e instabilidade do câmbio. “Mantivemos nossa política de investimento em pesquisa e tecnologia, bem como o lançamento de novos produtos”, resume Cláudio Palma, ao explicar como a indústria está superando tais dificuldades conjunturais.
Na ótica da DuPont, o grande gargalo identificado tem origem criminosa: o expressivo aumento na circulação de fluidos refrigerantes adulterados, causando sérios prejuízos para as empresas do setor. “Temos investido na realização de palestras técnicas em todo o País, com o intuito de orientar técnicos, instaladores e mecânicos dos setores de refrigeração e ar condicionado quanto à importância do uso de produtos com procedência reconhecida”, assegura Maurício Xavier.
Para a Termomecanica, a maior mazela setorial vem de fora. “Por mais que o governo brasileiro tenha entrado com diversas ações de salvaguarda, os importados ainda representam grande ameaça”, constata Marcelo Silva. Como exemplo disto ele cita os tubos de cobre, cuja entrada no País considera ter crescido quase 20% em 2013 com relação a 2012. A alternativa da indústria para manter-se competitiva tem sido investir nas instalações fabris, bem como na melhoria contínua de processos e produtos.
A Qualitas pensa de forma semelhante e aponta a China como fonte principal de preocupação, assim como concorrentes até brasileiros que deixam a desejar em quesitos básicos como segurança e durabilidade. “Ressaltamos também a carga tributária extremamente elevada e, especificamente neste ano, a alta de matérias-primas como aço, motor elétrico e cobre”, acrescenta Fernanda Stivalli, apontando alto padrão de qualidade, vendas técnicas e boa disponibilidade para pronta entrega como atenuantes significativos para esta questão.
Planejar e tomar decisões foi outro desafio do ano, no entender da Armacell, em meio a incertezas econômicas como a inflação e a variação cambial, que aumentaram custos num momento difícil para se pleitear reajuste aos clientes. Segundo Marcio Nieble, a alternativa foi aumentar a eficiência da operação e, ao mesmo tempo, maximizar todas as oportunidades de novos negócios.
Os reflexos de mais um ano de indústria em ritmo lento também foram sentidos no HVAC-R, onde empresas como a Apema – mesmo com vendas 10% maiores este ano, superando em muito a evolução do próprio PIB – confessam ter ficado com um gostinho de quero mais. “O mercado de equipamentos especiais, que exige investimentos maiores e está fortemente concentrado no setor industrial, não foi tão aquecido”, justifica Hugo Matos.
E embora reconheça a existência de bons momentos de demanda, há quem sinta falta de uma regularidade maior no setor, o que permitiria um atendimento sempre rápido dos pedidos em carteira. “O melhor mês do ano teve o dobro do faturamento do pior”, exemplifica Robert van Hoorn, da MultiVac. Manter estoques altos para garantir ao máximo a pronta entrega foi a solução encontrada pela empresa paulistana.
MALES CRÔNICOS
O fato de o Brasil ser um dos piores países do mundo em matéria de ambiente de negócios – segundo informa a pesquisa Doing Business, do Banco Mundial – também castigou as empresas do nosso HVAC-R, várias delas reclamando muito dos excessos de burocracia e impostos.
“Tudo isso aumenta custos e torna quase impossível cumprir todas as obrigações fiscais”, reclama Wilson Cará, da Forming Tubing. “Somos reféns de um sistema altamente burocrático e engessado”, acrescenta o empresário.
Denise Ehlers, da Soler & Palau, aponta como emblemática desta realidade a complexa Substituição Tributária do ICMS, aspecto que considera tão grave quanto questões históricas de infraestrutura como a falta de investimento em nossas rodovias. “A primeira providência é estar sempre bem informado sobre as notícias nacionais e internacionais, além de fazer uma administração enxuta e eficaz”, defende a executiva. “Temos uma linha de produtos importados que sofre bastante com a ineficiência e os altos custos dos portos brasileiros”, emenda André Corrêa, da Vulkan, para quem as empresas dependem totalmente dos governantes, na esperança de ter essa pendência histórica ao menos contornada.
Frente a tantos empecilhos, há quem diga na área que a solução continua sendo transformar toda e qualquer dificuldade em oportunidade. É o caso de Antonio Gobbi, da Full Gauge. “Mantemos na empresa a política de trabalhar cada vez mais com ações inovadoras, independentemente da conjuntura, sempre aumentando o investimento em desenvolvimento de novos produtos e marketing”, ensina o empresário.